
Embora pouco noticiado, estamos caminhando para um dos maiores apagões que o Brasil vai viver nos próximos anos. Trata-se do apagão de dados causado pela decisão de inviabilizar a realização do Censo 2021, com o corte de custos de mais de 90% do recurso necessário para desenvolver a pesquisa. Originalmente planejado para acontecer em 2020 (o censo é feito a cada 10 anos, e o último foi realizado em 2010), o censo já havia sido adiado para 2021 devido ao cenário incerto da pandemia. Agora, com a iminência de aprovação do Orçamento 2021 da União, veio a notícia: 71 milhões, ou menos de 4% do custo de realização do censo, foi destinado ao IBGE. Ou seja, ele não será realizado, novamente, este ano.
O censo é um estudo nacional que permite a criação de um raio-x da população brasileira em diversos aspectos: dimensão populacional (e todos as suas subdivisões), sexo, idade, raça e localização da população (divisão por regiões, estados, cidades, concentração rural X urbana), perfil de família, renda familiar, acesso à comunicação, incluindo a internet, acesso a redes de energia, esgoto, água… Sua importância é tamanha que a sua realização, na periodicidade de no máximo a cada 10 anos, está prevista em lei. Para poder reunir dados comparáveis e desenvolver análises confiáveis, ele deve ser realizado com toda a população brasileira dentro da mesma "janela de coleta", que normalmente começa em agosto e vai até outubro, por questões climáticas.
O censo realizado pelo IBGE é referência mundial pela sua capacidade de coletar dados em um país de dimensões continentais, com tamanha diversidade geográfica, climática e cultural. E também pelas metodologias usadas e pela qualidade da análise dos dados.
No relatório “A quem importa saber? A economia política da capacidade estatística na América Latina”, o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) avalia a capacidade estatística dos países latino americanos. No ranking, o Brasil figura em terceiro lugar, atrás de México e Colômbia, países que têm, aproximadamente, metade e ¼ da população brasileira, respectivamente. Portanto, não é apenas o Censo de 2020 (ou 2021, ou 2022…) que está em perigo, mas também o IBGE, uma instituição que todos nós deveríamos nos orgulhar.
As implicações da não realização do censo são imensas, e eu e a Carol Pinho vamos falar aqui um pouco sobre elas em uma série de 3 artigos sobre a asfixia de dados em curso. No primeiro, traremos uma visão mais política, procurando entender a quem (e por que) interessa esse apagão de dados. No segundo artigo, vamos refletir sobre a importância do censo não apenas para a gestão pública e o desenvolvimento de políticas estatais, mas também para o mercado e a iniciativa privada. No terceiro e último artigo, pensaremos sobre as consequências da não realização do censo para todos os demais estudos e pesquisas desenvolvidos no país.
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